Dom Nelson Francelino - Bispo Auxiliar da
Arquidiocese do Rio de Janeiro
"A obra educativa parece tornar-se cada vez
mais árdua porque, numa cultura que demasiadas vezes faz do relativismo o seu
próprio credo, acaba por faltar a luz da verdade”. (Bento XVI)
O
ensino religioso na escola constitui uma exigência da concepção antropológica
aberta à dimensão transcendental do ser humano: é um aspecto do direito à
educação. Sem esta disciplina, os alunos estariam privados de um elemento
essencial para a sua formação e desenvolvimento pessoal, que os ajuda a atingir
uma harmonia vital entre a fé e a cultura. A formação moral e a educação
religiosa favorecem também o desenvolvimento da responsabilidade pessoal e
social e demais virtudes cívicas, e constituem então um relevante contributo
para o bem comum da sociedade.
Numa
sociedade pluralista e laica como a nossa, o direito à liberdade religiosa
exige a garantia da presença do ensino da religião na escola e a garantia que
tal ensino seja conforme as convicções dos pais. Pois, como recorda o Concílio
Vaticano II: “[Aos pais] cabe o direito de determinar o método de formação
religiosa a dar aos filhos, segundo as próprias convicções religiosas. (...)
Violam-se os direitos dos pais quando os filhos são obrigados a frequentar
aulas que não correspondem às convicções religiosas dos pais, ou quando se
impõe um tipo único de educação, do qual se exclui totalmente a formação
religiosa” (Declaração Dignitatis humanae 5). Esta afirmação encontra
correspondência na Declaração universal dos direitos do homem (art. 26) e em
tantas outras declarações e convenções da comunidade internacional.
O
Ensino Religioso no currículo escolar está garantido desde a constituição
Federal promulgada em 1987/1988. Naquela época, o texto constitucional dizia
que: “O Ensino Religioso ocupa-se com a educação integral do ser humano, com
seus valores e suas aspirações mais profundas. Este ensino quer cultivar no ser
humano as razões mais íntimas e transcendentais, fortalecendo nele o caráter de
cidadão, desenvolvendo seu espírito de participação, oferecendo critérios para
a segurança de seus juízos e aprofundando as motivações para a autêntica
cidadania.” Portanto, não se pretende fazer da sala de aula uma comunidade de
fé, mas um espaço privilegiado de reflexão sobre limites e superações. Isto
implica na necessidade de se construir uma pedagogia que favoreça tal
perspectiva.
A
marginalização do ensino da religião na escola leva a assumir, pelo menos na
prática, uma posição ideológica que pode induzir ao erro ou produzir um
prejuízo para os alunos. Além disso, poder-se-ia também criar confusão ou gerar
um relativismo ou indiferentismo religioso se o ensino da religião estivesse
limitado a uma exposição das várias religiões de modo comparativo e “neutro”. A
propósito, João Paulo II explicava: “A questão da educação católica compreende
(…) o ensino religioso no âmbito mais alargado da escola, seja ela católica ou
do estado. À tal ensino têm direito as famílias dos crentes, que devem ter a
garantia de que a escola pública – exatamente porque aberta a todos – não só
não ponha em perigo a fé dos seus filhos, mas, antes, complete, com adequado
ensino religioso, a sua formação integral. Este princípio está enquadrado no
conceito de liberdade religiosa e do Estado laico verdadeiramente democrático,
que, enquanto tal, isto é, no respeito da sua profunda e verdadeira natureza,
se coloca ao serviço dos cidadãos, de todos os cidadãos, no respeito dos seus
direitos e das suas convicções religiosas” (Discurso aos Cardeais e aos
colaboradores da Cúria Romana, 28 de Junho de 1984).
Por
intermédio de práticas educacionais, o Ensino Religioso viabiliza o exercício
da tolerância e o respeito à diversidade, principalmente porque o lugar da
escola pública permite a reunião de diversas representações de fé. Aqueles que
são favoráveis a esta disciplina não devem pretender fazer da sala de aula um
lugar de proselitismo, mas um espaço privilegiado de reflexão sobre direitos,
deveres e fraternidade. Isto implica na necessidade de se construir uma
pedagogia que favoreça tal perspectiva, porque o seu objetivo é fruto de
experiências pessoais, de incansáveis buscas de respostas para questões
existenciais: “as religiões são parte importante da memória cultural e do
desenvolvimento histórico de todas as sociedades. Desse modo, abrir espaços
para ensinar religiões (e não uma religião) na Escola não deve ser feito para
defesa de uma delas, em detrimento de outras, mas discutindo-se princípios,
valores, diferenças e tendo em vista – sempre – a compreensão do outro.”
Com
estes pressupostos, compreende-se que o ensino da religião plural tem a sua
especificidade na relação com as outras matérias escolares. Na verdade, como
explica o Concílio Vaticano II: “a autoridade civil, que tem como fim próprio
olhar pelo bem comum temporal, deve, sim, reconhecer e favorecer a vida
religiosa dos cidadãos, mas excede os seus limites quando presume dirigir ou
impedir os atos religiosos” (DH 3). Por estes motivos compete à Denominação
religiosa estabelecer os conteúdos autênticos do ensino da religião na escola,
que garanta diante dos pais e dos próprios alunos a autenticidade do ensino que
se transmite, independentemente da natureza da escola (estatal ou não estatal,
católica ou não católica) em que é ensinada.
Fonte:
Arquidiocese
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