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29 de março de 2013

As quatro chuvas do Lava-Pés

A História da Salvação é repleta de acontecimentos meteorológicos por meio dos quais Deus se manifesta ao povo escolhido, guiando-o pelo caminho que Ele escolheu.  É o caso, por exemplo, da chuva de pedras que se abateu sobre o Egito e dizimou os rebanhos dos egípcios (Ex 9, 18-34).  É o caso, também, da chuva que se abateu sobre a Terra até inundá-la completamente – o Dilúvio (Gn 7, 1-17).  É o caso, ainda, do eclipse que se abate sobre a Terra no exato instante em que Jesus expira pela última vez, na Cruz (Lc 23, 45).


São eventos extraordinários, todos eles.  Fascinam pela efetividade terrena e espiritual.  E servem, ainda hoje, como lições para o Povo de Deus que ainda trilha o caminho da salvação.  Mostram também o quanto o Senhor é merecedor da nossa confiança.
Não cabe, aqui, discorrer sobre a veracidade literal de cada um desses eventos.  Definitivamente, não é esse o propósito.  É possível que muitos deles sejam meras alegorias de fatos há muito tempo acontecidos, repetidos nos ensinamentos passados oralmente, de geração em geração, e que a nós chegaram dessa maneira em afeição à didática.  Tal discussão, contudo, deve ser deixada para depois.
O que importa, sim, é notar que ainda hoje Deus nos fala através da natureza que ele próprio criou com sua mão e que, depois de a ter criado, viu que tudo era bom (Gn 1, 1-25).  E essa maneira tão peculiar de Deus se comunicar com seus filhos amados se fez presente ontem, na nossa comunidade, durante a cerimônia do Lava-Pés.  Por quatro vezes Deus enviou a chuva ao seu rebanho, e por quatro vezes ele também a fez cessar.
Mais do que o ir e vir da chuva, foi muito interessante observar o momento escolhido por Deus para lançá-la sobre a parcela do povo que ele escolheu abençoar naquela noite.  Vamos relembrar tais momentos.
A primeira chuva atingiu seu ápice durante o Ato Penitencial.  Quem não se lembra de ter buscado refúgio enquanto repetia “Piedade! Piedade! Piedade de nós!”?  A água que caía do céu não caía do céu, mas era aspergida do Céu.  Era como se Deus se valesse da chuva para purificar seu rebanho, tal como no nosso batismo.  Encerrado o Ato Penitencial, a chuva cessou em poucos segundos.
A segunda oportunidade em que a chuva se abateu sobre a assembleia se foi durante a leitura do Evangelho.  O momento de maior intensidade da precipitação ocorreu justamente durante a leitura do versículo 10 do capítulo 13 do Evangelho de João: “Disse-lhe Jesus: Aquele que está lavado não necessita de lavar senão os pés, pois no mais todo está limpo. Ora vós estais limpos, mas não todos.”.  Se quem está limpo só precisa lavar os pés, os que não estão completamente limpos precisam ainda de um banho.  A chuva, naquele momento, então, era como se Deus nos quisesse banhar.  Jesus podia ter banhado Judas para limpá-lo.  Não o fez para que o plano de Deus se cumprisse fielmente.  Ele precisava ser entregue para morrer por nós e, posteriormente, ressuscitar.  No nosso caso, diferentemente, reconhecendo nossas fraquezas, mas repleto de compaixão, Deus enviou a chuva para nos limpar os pés e o corpo, retirando de nós toda culpa de nossos pecados, como que nos transferindo do grupo de Judas Iscariotes para o grupo dos demais apóstolos.
A terceira vez que choveu foi durante a coleta.  Enquando o padre preparava as oferendas sobre o altar, o povo era agraciado mais uma vez com as bênçãos que desciam do céu em forma de gotas d’água.  Ao mesmo tempo que o povo trazia ao altar uma parcela do resultado de seu trabalho para oferecer em sacrifício ao Senhor, ao mesmo tempo que o povo atendia ao chamado quaresmal de praticar a esmola, o Senhor abençoava o povo por ter respondido ao seu chamado, por ter escutado a sua pregação, por ter buscado, durante a Quaresma, o verdadeiro significado desse tempo.  Era como se Deus respondesse afetuosa e paternalmente ao esforço de conversão de seu povo, esforço esse que estava simbolizado naqueles bens levados ao altar, em sua honra.
A quarta e última vez que a chuva se abateu sobre a comunidade, durante a missa, foi no momento da comunhão.  Que hora mais propícia para que Deus reforçasse a sua presença no meio de seu rebanho!  Como se não bastasse estar ali, vivo, em corpo e sangue, Ele também quis abraçar seu povo, tocado cada um com gotas de água.  Assim como a água misturada ao vinho durante o sacrifício simboliza a imersão do povo no sangue de Jesus, aquela mesma água caída do céu poderia simbolizar a imersão de Deus no meio de seu povo.
Deus age nos pequenos detalhes de nossas vidas, tão sutilmente que nós não percebemos.  É preciso estar atento para perceber.  Mas mesmo que não estejamos, basta-nos a certeza e a confiança de que Ele está, e por nós zela como pai – com amor, carinho e alegria, mesmo quando não notamos.
Leandro Moreira

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